Aqui se conta a história de
Lampião,
o famoso
capitão Virgolino Ferreira, também conhecido como o "Rei do Cangaço". Não
toda ela, pois não é fácil abranger de forma completa a saga de um brasileiro que pode
ser equiparado, em fama e feitos, aos famosos personagens do velho oeste americano. Para
facilitar o entendimento, ainda que parcial, é necessário situar a história e seu
personagem principal no meio físico em que nasceu, viveu e morreu.
Descrever o nordeste, por
onde andou Lampião, sem entrar na costumeira lista de nomes de vegetais, tipos de solo e
outros detalhes semelhantes, é uma tarefa ingrata. Resultaria desnecessária para quem
já conhece a região e incompleta para quem nunca esteve lá.
Embora aparentemente agreste
o nordeste é de natureza rica e variada. Ou talvez seja melhor dizer que é um misto de
riqueza e pobreza, com imensa quantidade de espécies em sua fauna e flora, embora de
clima seco durante a maior parte do ano. Chove muito pouco, o chão é seco e poeirento. A
vegetação é rasa e, na maior parte do ano, de cor cinza. De vez em quando surgem
árvores cheias de galhos, também secos, frequentemente cobertos de espinhos que, se
tocarem a pele, ferem. Raramente se encontra um local onde haja água, mas onde ela se
apresenta a vegetação é muito mais verde, apesar de não radicalmente diferente de no
restante da região. Saindo da planície e subindo para as partes mais altas, atingindo as
serras e os serrotes, o ar tornar-se mais frio e as pedras desenham a paisagem.
Não há estradas, só
caminhos, abertos e mantidos como trilhas identificáveis pela passagem dos que por ali
circulam, geralmente a pé.
Em breves palavras, esse era
o ambiente em que Virgolino Ferreira passou toda sua vida. Pode-se dizer que muito pouco
mudou desde então.
LAMPIÃO E SUA
HISTÓRIA
Versos de Gonçalo Ferreira
da Silva, do cordel "Lampião - O Capitão do Cangaço":
O século
passado estava dando sinais de cansaço, José e Maria presos por matrimonial laço em breve seriam pais do grande rei do cangaço. No dia quatro de junho de noventa e oito, a pino estava o Sol, e Maria dava à luz um menino que receberia o nome singular de Virgulino. |
A família
Virgolino Ferreira da Silva
era o terceiro dos muitos filhos de
José Ferreira da Silva e de Maria Lopes. Nasceu em 1898, como consta em sua
certidão de batismo, e não em 1897, como citado de várias obras.
A família Ferreira
formou-se na seguinte sequência, por datas de nascimento:
1895 - Antonio Ferreira dos
Santos
1896 - Livino Ferreira da Silva
1898 - Virgolino Ferreira da Silva
???? - Virtuosa Ferreira
1902 - João Ferreira dos Santos
???? - Angélica Ferreira
1908 - Ezequiel Ferreira
1910 - Maria Ferreira (conhecida como Mocinha)
1912 - Anália Ferreira
1896 - Livino Ferreira da Silva
1898 - Virgolino Ferreira da Silva
???? - Virtuosa Ferreira
1902 - João Ferreira dos Santos
???? - Angélica Ferreira
1908 - Ezequiel Ferreira
1910 - Maria Ferreira (conhecida como Mocinha)
1912 - Anália Ferreira
Todos
os filhos do casal nasceram no sítio Passagem das Pedras, pedaço de terras desmembrado
da fazenda Ingazeira, às margens do Riacho São Domingos, no município de Vila Bela,
atualmente Serra Talhada, no Estado de Pernambuco.
Esse
sítio ficava a uns 200 metros da casa de dona Jacosa Vieira do Nascimento e Manoel Pedro
Lopes, avós maternos de Virgolino. Por causa dessa proximidade Virgolino residiu com eles
durante grande parte de sua infância. Seus avós paternos eram Antonio Ferreira dos
Santos Barros e Maria Francisca da Chaga, que residiam no sítio Baixa Verde, na região
de Triunfo, em Pernambuco.
A
infância de Virgolino transcorreu normalmente, em nada diferente das outras crianças que
com ele conviviam. Todas as informações disponíveis levam a crer que as brincadeiras de
Virgolino com seus irmãos e amigos de infância eram nadar no Riacho São Domingos e
atirar com o bodoque,
um arco para bolas de barro. Também brincavam de cangaceiros e volantes, como todos os outros meninos da época, imitando, na fantasia, a realidade do que viam à sua volta, "enfrentando-se" na caatinga. Em outras palavras, brincavam de "mocinho e bandido", como faziam as crianças nas outras regiões mais desenvolvidas do país.
Foi
alfabetizado por Domingos Soriano e Justino de Nenéu, juntamente com outros meninos.
Freqüentou as aulas por apenas três meses, tempo suficiente para que aprendesse as
primeiras letras e pudesse, pelo menos, escrever e responder cartas, o que já era mais
instrução do que muitos conseguiam durante toda sua vida, naquelas circunstâncias.
O
sustento da família vinha do criatório e da roça em que trabalhavam seu pai e os
irmãos mais velhos, e da almocrevaria. O trabalho de almocreve estava mais a cargo de
Livino e de Virgolino, e consistia em transportar mercadorias de terceiros no lombo de uma
tropa de burros de propriedade da família.
Os
trajetos variavam bastante, mas de forma geral iniciavam-se no ponto final da Great
Western, estrada de ferro que ligava Recife a Rio Branco, hoje chamada
Arcoverde, em Pernambuco.
Ali recolhiam as mercadorias a serem distribuídas pelos locais designados por seus
contratantes, em diversas vilas e lugarejos do sertão. Esse conhecimento precoce dos
caminhos do sertão foi, sem dúvida, muito valioso para o cangaceiro Lampião, alguns
anos mais tarde.
Por duas
vezes Virgolino acompanhou a tropa até o sertão da Bahia, mais exatamente até as
cidades de Uauá e Monte Santo. Nesta última havia um depósito de peles de caprinos que
eram, de tempos em tempos, enviadas pelo responsável, Salustiano de Andrade, para a Pedra
de Delmiro, em Alagoas, para processamento e exportação para a Europa.
Esta
informação nos foi prestada por dona Maria Corrêa, residente em Monte Santo, Bahia.
Dona Maria Corrêa, mais conhecida como Maria do Lúcio, exercia a profissão de parteira
e declarou-nos que, quando jovem, conheceu Virgolino Ferreira durante uma de suas visitas
ao depósito de peles.
Como
curiosidade e melhor identificação, dona Maria Corrêa é a parteira que foi condecorada
pelo então presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira ao completar mil partos realizados
com sucesso.
É bom
frisar que as peles caprinas não eram compradas pelos Ferreira, apenas transportadas por
eles, num serviço semelhante ao do frete rodoviário dos dias atuais.
Em quase
todas suas viagens os irmãos tinham a companhia de Zé Dandão, indivíduo que conviveu
durante muito tempo com a família Ferreira.
Esses
depoimentos positivos merecem especial atenção e ainda maior credibilidade por terem
sido prestados por pessoas inimigas da família. Apesar da inimizade preferiram contar a
verdade a denegrir gratuitamente o nome de José Ferreira.
A mãe de
Virgolino já era um pouco diferente, mais realista em relação ao ambiente em que
viviam. De maneira geral todos os entrevistados declararam que José Ferreira desarmava os
filhos na porta da frente e dona Maria os armava na porta de trás dizendo:
- Filho
meu não é para ser guardado no caritó. Não criei filho para ser desmoralizado.
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